Heidegger foi tudo menos original.
Imaginem que alguém inventava uma determinada linguagem codificada — de tipo linguagem computacional MSDOS do Windows, embora diferente deste no que diz respeito à codificação dos símbolos — por forma a interagir com a linguagem-máquina de um computador (a linguagem binária), e que lhe permitisse construir programas informáticos que fizessem as mesmas coisas que, por exemplo, o Windows faz. A “originalidade” desta nova linguagem seria meramente formal, e não de conteúdo. E a originalidade propriamente dita não pode ser apenas formal.
É o que se passa com Heidegger. Ele criou um “código privado” para dizer as mesmas coisas que outros pensadores tinham já dito — por exemplo, Nietzsche — em uma linguagem tradicional e normal. E a criação, por parte de Heidegger, desse “código linguístico” privado tem também um pouco a ver com o tradicional complexo alemão em relação ao seu idioma que foi, até ao século XIX, geralmente considerado “inferior”: mediante uma “complicação” artificial e intencional da “linguagem-código”, Heidegger pretendeu afirmar a superioridade da língua alemã em relação às outras línguas europeias (por exemplo, teimando na superioridade poética de Hölderlin sobre todos os poetas da humanidade: “Hölderlin über Alles”).
Por exemplo, o conceito de “Cuidado” (Sorge), segundo Heidegger, é apenas a transmutação para a sua (dele) “linguagem-código” do conceito tradicional e cristão mais abrangente de “sentido de vida”, e do conceito de “curare” das Confissões de Santo Agostinho. Nada de novo, na essência.
Heidegger é um Nietzsche suave e dissimulado, até no sentido em que é menos um filósofo do que um literato, embora não tenha a genialidade literária de Nietzsche. Utilizando a sua “linguagem-código” privada, Heidegger transformou a filosofia em uma série de romances que qualquer leitor segue ao sabor da sua respectiva subjectividade, não se dando conta de que está a ler uma súmula estiolada da história da filosofia.
Heidegger pegou na História da Filosofia, alterou a “linguagem-código” formal e tradicional de interacção com a “linguagem-máquina” das Ideias, enviesou os conceitos filosóficos em favor da pura imanência nietzscheana, e depois declarou que aquilo que escreveu era exclusivamente da sua própria autoria e originalidade.
Até a “Viragem” de Heidegger (Kehre), que aconteceu depois da II Guerra Mundial, foi apenas uma "nova edição" da série principal de romances destinados a um determinado público apreciador da “linguagem-código” de Heidegger — assim como, por exemplo, Agatha Christie, mediante o seu tipo de linguagem característico, teve várias séries de romances policiais intercaladas no tempo.
Em termos de conteúdo, não há nada de novo em Heidegger — a não ser que o leitor desconheça o que lhe é anterior no tempo; mas, neste caso, também não compreende os romances de Heidegger.